Crise no Mar Vermelho: operadores logísticos já sentem o efeito nos custos

As filas de espera para descarregar contêineres em portos provocam o aumento do frete para embarcadores e trazem desafios à logística portuária

Aline Feltrin

A crise no Mar Vermelho já afeta os custos do transporte rodoviário de carga nos portos brasileiros, depois de encarecer o frete marítimo. Em entrevista ao site da Transporte Moderno, Rafael Dagnoni, CCO do TECADI, operador logístico presente nos portos de Santa Catarina, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, relata que a superlotação nos depots – leia-se onde os contêineres vazios são armazenados antes ou após serem carregados em navios – e nos terminais tem sido uma das maiores dificuldades para o setor de logística portuária.

“A interrupção das rotas marítimas pelo Mar Vermelho fez com que os armadores deixassem de levar contêineres vazios para repor em outras regiões, o que sobrecarregou os portos do Sul do Brasil e começou a afetar o porto de Santos”, diz Dagnoni. Conforme o executivo, isso tem lotado os terminais e dificulta a coleta dos contêineres vazios.

Com o atual cenário, houve aumento do tempo de espera e falta de disponibilidade de equipamentos. Os resultados são custos adicionais significativos para o transporte rodoviário de carga. Dagnoni revela que, para evitar caminhões parados em filas por até 15 dias, há um remanejamento para outros terminais.

Na visão do executivo, o momento é delicado, pois a ineficiência obriga as empresas de logística repassar os custos extras para o preço do frete, que quase dobrou de valor. “Agora, temos de acrescentar os valores do gerenciamento do contêiner, o que envolve uma equipe adicional para realizar o agendamento de devolução dos equipamentos.”

O ponto crítico, segundo ele, é que, em linhas gerais, o caminhão já é subutilizado no Brasil, e as filas em portos agravam a situação, o que acarreta na perda de produtividade. Além do preço do frete, há outras consequências. No varejo, por exemplo, não há garantia de disponibilidade de mercadoria na data prevista.

Na visão de Dagnoni, é urgente rever a estrutura dos depots e terminais, com a adoção de horários estendidos de funcionamento para aumentar a capacidade de atendimento e absorção da demanda. Ele enfatiza a importância de repensar o modelo de operação dos principais portos do Brasil, como Santa Catarina e Santos, para lidar com os desafios decorrentes da crise no Mar Vermelho.

Estresse em cadeia

Maiara Cordova, gerente de importação de produtos marítimos do Grupo Allog, agente de cargas especializado em transporte internacional, destaca que, embora os serviços diretos entre Ásia e Brasil não sejam afetados de forma direta pela crise no Mar Vermelho, muitas rotas alternativas que serviam como soluções para melhorar as condições de transporte passavam pela região afetada. “Com a interrupção desses serviços, houve uma congestão nas operações, comprometendo a capacidade de atendimento. E isso impactou os prazos de entrega em até 15 dias.”

Segundo Maiara, a mudança não prevista tem afetado diretamente os clientes finais, que agora enfrentam tempos de trânsito mais longos e dificuldades na gestão do espaço de carga. A executiva classifica a situação como um estresse em cadeia, pois quando o navio chega com atraso, aumenta a necessidade de urgência da entrega e há um grande impacto do transporte rodoviário de carga. “A logística nacional não absorve isso”, analisa.

Em linhas gerais, os principais gargalos enfrentados pela Allog são o aumento no trânsito e a eventual dificuldade de gerenciamento de espaço até a situação se acomodar. “Fica também uma preocupação em relação a essas demandas da Ásia, onde há maior volumetria de importação para o Brasil”, complementa.

 O que está acontecendo no Mar Vermelho?

Desde o fim do ano passado, membros do grupo armado rebelde conhecido como houthis, do Iêmen, têm atacado diversos navios no Mar Vermelho, uma importante rota comercial que liga a Ásia e a Europa. Na ponta norte do Mar Vermelho está o Canal de Suez, que conecta a hidrovia ao Mar Mediterrâneo.

Trata-se da rota naval mais curta entre esses dois continentes, por isso entre 10% e 15% da carga marítima global é escoada por meio dela. Os ataques a navios na região obrigaram cargueiros a desviarem de rota em percursos mais longos, o que gerou alta de custos e provocou atrasos logísticos. Algumas empresas, como a Maersk e CMA CGM, interromperam momentaneamente suas operações na área no início do ano.

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